Como comunidade de fé, estamos avançando em nossa caminhada rumo a pascoa do Senhor, mas será que Deus espera somente que a relembremos ou que realmente sejamos pessoas transfiguradas? Nada teria sentido com a simples memória!
A páscoa é o evento central da fé cristã, o qual não devemos ser indiferentes, pois Jesus em seu curto ministério, nos revelou a face amorosa de Deus e seu desejo de salvação. Ao contrário do que muitos pregam ou acreditam, Jesus não veio condenar, mas salvar no amor e doação de si mesmo, abraçando até as últimas consequências o gesto desta entrega. No entanto, ninguém para e reflete sobre a morte de Jesus, muitos creem piamente que ele foi enviado para morrer em nosso lugar, nos salvar do pecado. Jesus realmente veio nos apontar outro caminho diferente do pecado e da injustiça, mas sua morte não foi querer de Deus, mas fruto da violência, ganancia e incompreensão daqueles que detinham o poder religioso, econômico e político de Israel.
A campanha da fraternidade deste ano, nos convida a refletir o tema da violência em nosso país, que atinge a todos direto e indiretamente. Se cremos de corpo e alma no Deus da vida, não podemos permanecer indiferentes frente a tanta atrocidade, pois outros Jesus são martirizados diariamente, por questões diversas. Jesus foi morto porque pensava e agia diferente. Não agia como “a galera”, mas defendia e partilhava a mesa e a vida com os marginalizados. No entanto hoje, depois de 20 séculos, nos transformamos em uma Igreja soberana, burguesa que não promove os marginalizados, mas infantiliza e mantém um assistencialismo fajuto.
Esquecemos que como Igreja, somos chamados a ser “sal da terra e luz do mundo”. A omissão também é um grave pecado e como cristãos, não podemos ser a meias. Se hoje somos chamados de cristãos, é porque o homem de Nazaré viveu plenamente e se entregou por inteiro a favor da vida, como o enviado do Pai.
Estamos celebrando o 4º domingo da quaresma, deixemos que as leituras com seus apelos, nos falem ao coração. Mergulhemos por inteiro na mística quaresmal para renascer com Cristo na páscoa.
Na 1º leitura de 2 crônicas 36, 14-23, temos uma recapitulação da infidelidade do povo de Israel, motivo pelo qual eles atribuem o exílio babilônico e demais desgraças sucedidas a Israel durante este tempo. Com a sucessão do império Persa, Israel volta a ter uma certa autonomia, dentre elas, a liberdade religiosa. Todos estes fatos são reforçados com textos das Sagradas Escrituras.
O salmo 136 exclama: que se prenda a minha língua ao céu da boca, se de ti, Jerusalém eu me esquecer! É um belo salmo, que recorda os momentos sofridos no exílio da Babilônia. Vemos nele o saudosismo e o amor à pátria de um israelita exilado. Quantas pessoas que hoje vivem em nosso país, longe de sua pátria, de seus amigos e familiares, a causa da violência e miséria. Que possamos ser mais irmãos e solidários com estas pessoas que sofrem silenciosamente em seus corações.
A 2º leitura da carta aos Efésios 2, 4-10. O autor nos lembra que somos salvos pela graça de Deus e seu infinito amor.
O evangelho de João 3, 14-21 temos o enigmático diálogo entre Jesus e Nicodemos. Estamos no quarto evangelho, que traz um modelo próprio de desenvolver sua narrativa, que se assemelha a uma catequese. No início ele trabalha com pessoas que se aproximam da fé em Cristo e no decorrer do evangelho percebemos um aprofundamento com os aqueles que já fazem parte da comunidade e da fé em Cristo.
O personagem de Nicodemos, representa um iniciado na fé, que mesmo sendo mestre de Israel, precisa refazer seu caminho de fé. Na narrativa de hoje, temos a continuação de um diálogo entre Jesus e Nicodemos. Nicodemos como bem sabemos pertencia ao grupo dos fariseus, mas que se atraiu aos ensinamentos de Jesus, ainda que tivesse dificuldade para compreende-los. A comunidade joanina para falar da paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo para os judeus, parte daquilo que eles já conhecem. “Assim como a serpente foi levantada no deserto, como sinal de salvação, assim também o Filho do homem, será levantado”. A crucificação de Jesus, não foi uma escolha masoquista, mas um sinal total de sua entrega em favor de toda a humanidade, poie ele veio nos salvar e não nos condenar. No entanto, requer de nós um posicionamento em favor da vida ou da morte, transformados em gestos concretos. Esta escolha é livre e determinada pela fé.
A vida eterna, em João não se refere somente a vida após a morte, mas uma vida plena, plena de sentido...
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