Jesus no horto se prostrou por terra, Maria, irmã de Lázaro em um gesto de honra a Jesus, unge seus pés e os enchova com seus cabelos; o oficial romano suplica de joelhos pela vida de seu filho... Como vemos a oração é um gesto que participa todo o corpo e quanto mais eficiente será, quanto mais consciência tivermos disso.
Ao longo da história da Igreja, o corpo foi desprezado, devido a influência platônica que recebemos. O corpo era motivo de pecado para a alma, por isso devia ser mortificado. Desde o concilio vaticano II, a Igreja recuperou a unidade de ser humano como corpo e alma por inteiro e não separados. A encíclica Gaudium et spes no número 3 traz uma nova visão antropológica: unitária e coletiva. O ser humano já não mais é visto como corpo e alma separados, opostos: visão dualista, mas sim como um todo, chamado a se relacionar com o meio onde vive. É uma visão positiva que integra ser e realidade:
O homem, ser uno, composto de corpo e alma, sintetiza em si mesmo, pela sua natureza corporal, os elementos do mundo material, os quais, por meio dele, atingem a sua máxima elevação e louvam livremente o Criador (GS 14).
No entanto, a visão antiga permanece na cabeça de muitas pessoas, além de ser fomentada por pessoas (leigos, religiosos, sacerdotes) que não conseguiram fazer esta ponte, que corresponde a fé inicial do cristianismo, visto que nascemos no mundo semita, onde o corpo e alma formavam uma unidade. O dualismo começou a influenciar a fé cristã, quando o cristianismo foi helenizado.
Para falar da importância do corpo no gesto orante, me apoio no monge e psicólogo alemão, Anselm Grun, em sua obra: rezar com o corpo – o poder curativo dos gestos. Obra que escreveu com um co-irmão: Michael Reepen.
Grun destaca que quando descobrimos a poder dos gestos e de orar com corpo, as reflexões teóricas são secundárias, pois orar conscientemente com nosso corpo, nos permite entrar em contato primeiramente conosco e perceber como estamos: tensos, bloqueados, irritados, alegres, tristes, pois tudo isso reflete diretamente em nosso corpo e como nos relacionamos com o outro, com as coisas e o mundo. “O corpo não mente, ele é mais honesto que nosso entendimento” (Grun). Esta realidade também pode ser percebida no âmbito da fé, onde dizemos crer em Deus, mas diante das dificuldades tencionamos o corpo, nos angustiamos, isso mostra que ainda estamos agarrados a nós mesmo e estamos longe de nos entregarmos a Deus. É uma realidade onde se tem “a fé com a cabeça, mas ainda não com o corpo. A fé precisa escorrer da cabeça para o corpo, pois só assim é capaz de tomar conta da pessoa inteira...” (Grun).
Segundo Anselm Grun e Michael Reepen, o encontro com nosso corpo tem dois aspectos: por um lado o corpo é um “barômetro” que mostra como está o nosso corpo e qual é a sua real situação, onde temos medo e nos agarramos. Ele nos diz quem somos de fato. Ele se comunica mesmo que estejamos em silencio. No entanto, o corpo também é um instrumento com o qual podemos modificar nossa atitude interior, pois segundo Karlfried Graf Durkheim, nosso corpo é o lugar da individuação e da experiência com Deus, pois através do corpo também encontramos a Deus. “Ele é um parceiro importante não só no caminho até a maturidade humana, mas também no nosso caminho espiritual, no caminho até Deus” (Durkheim).
Por um lado, segundo Durkheim, assim como Grun e Reepen, o corpo indica como está a nossa relação com Deus, se realmente nos abrimos, nos entregamos a Ele, se confiamos nele e nos abrimos para Ele. O corpo nos revela se estamos presentes ou distraídos, se estamos receptivos para Deus ou se fugimos dele e de nós mesmos, pois os gestos de oração são expressão da nossa experiência de Deus e que ao mesmo tempo nos conduz até ele. O gesto exterior ocasiona uma atitude interior e uma experiência interior. Quando aceitamos fazer o gesto, entramos em contanto com as intuições de Deus que já estão presente em nosso coração, mas que se encontram soterradas debaixo da superfície da consciência cotidiana.
Grun e Reepen destacam algo que eu mesma pude experimentar várias vezes: sobretudo em época de vazio interior, orar com o corpo ajuda a segurar-nos em Deus, e abrir-nos novamente para Ele e adquirir um faro fino para Ele.
Para mim, Juliana, uma das posturas mais queridas e profundas é a da prostração, pois nela experimento o abandono em Deus, sinto que nesta postura ele me abraça, meu recolhe, me submerge inteiramente nele. Sempre senti a prostração como uma postura libertadora, especialmente nos momentos de tristeza, de peso emocional. Também medito muito com a postura da flor de lótus, tão difundida no zen budismo, onde recolho todos os sentidos, combato os vários demônios da distração
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