Estamos na semana da Misericórdia, por isso vamos refletir sobre a misericórdia em Santo Agostinho. A festa da Divina Misericórdia, foi instituída no ano 20000, pelo Papa João Paulo II, a partir da devoção a Jesus misericordioso, segundo os relatos e aparições que recebeu Santa Maria Faustina. Esse é um tipo de devoção particular (Faustina e João Paulo II) que foi imposta a toda a Igreja, no entanto o tema da misericórdia é sempre atual, pois o amor e a salvação oferecidos por Deus, é uma proposta aberta a toda a criação, em diferentes contextos e épocas.
A reflexão sobre a misericórdia em Santo Agostinho, parte da experiência de sua própria de vida, pois foi um homem profundamente tocado pela misericórdia de Deus, o que resultou em um homem brilhantismo, que contribuiu para a história da Igreja e sua doutrina. Sua experiência foi tão profunda e radical, que no ano 391, escreveu o livro das confissões, onde confessou sua vida errante, mas sobretudo, cantou a misericórdia de Deus. Em um sermão confessou que tendo saído do ninho antes de saber voar, foi tocado pela misericórdia de Deus para ser novamente levada ao ninho, antes que fosse pisado pelos que passavam ou morresse prematuramente.
Para Santo Agostinho, Deus se dá a conhecer primeiramente na misericórdia. Aos seus fiéis ele explicava de modo especial, a misericórdia que socorre a necessidade do pobre.
Em sua etimologia, a palavra Misericórdia significa sentir compaixão com a coração, pois nela está a junção de duas palavras latinas: miserere: compaixão e cordis; coração, ou seja, a misericórdia é um sentir com o outro desde as entranhas.
Referindo-se à misericórdia, Agostinho também traz presente o simbolismo do coração, pois este indica o homem em sua existência concreta. Para Agostinho o homem se identifica com o amor e crê que para encontrar a misericórdia de Deus, precisa descer ao coração: lugar da intimidade, pois Deus age desde dentro daquilo que somos. Quando a misericórdia invade o coração, o homem vê que naquele momento, Deus está nele presente e, por isso, é capaz de sair de si mesmo e se aproximar de Deus, dos demais e do seu próprio mistério.
A misericórdia deste modo torna-se um dos caminhos através dos quais Deus se aproxima do mundo, de suas raízes mais profundas. Esta é uma visão belíssima, no entanto desvalorizada, pois o ser humano tem medo de olhar para si mesmo e de encontrar-se com a sua própria verdade, por isso busca milagres e ritos mágicos: porta santa, água benta, amuletos... crendo que são meios eficazes de se chegar a Deus e obter seu perdão.
O santo de Hipona acreditava que a existência humana é o tempo da misericórdia de Deus, sendo esta uma ponte entre Deus e os homens, por isso afirmava que o Sermão da Igreja deveria ter como sujeito específico, a misericórdia divina, pois esta desperta a consciência de ser recebedor da Graça misericordiosa de Deus, da qual nasce sua consciência de Misericórdia e compaixão com o outro. Santo Agostinho acreditava que com a misericórdia o homem aprende a sentir-se unido ao seu semelhante. Por tal experiência, o homem conhece a humanidade não desfigurada pelo mal e no encontro com seu semelhante reconhece e recupera a sua própria humanidade.
Em conclusão, a misericórdia para Santo Agostinho é uma das maiores mediações que permite ao homem conhecer a si mesmo, o mistério da própria humanidade que liga aos seus semelhantes.
Sondando as obras de Agostinho, descobrimos um pregador dá misericórdia, um homem preocupado com as misérias de sua época, mas também com a autenticidade da fé professada em Jesus Cristo. Em um sermão ele perguntou a assembleia em que consistia a misericórdia, algo que ele mesmo respondeu sabiamente: a misericórdia é encher o coração com um pouco de miséria do outro, o que implica sentir com o coração, por isso diz: "se deres pão a quem tem fome, doe-lhe com a participação do coração, pois se amamos a Deus e ao próximo não podemos fazer nada sem sentir compaixão no coração" (sermão 358).
Santo Agostinho foi um místico, um ser imerso em Deus, que tendo se convertido ao cristianismo optou por um novo estilo de vida, fundando um monacato com seus amigos, por isso refletiu o tema da misericórdia na pratica por vários âmbitos, entre eles podemos citar a misericórdia no falar. Quão atual é o pensamento de Santo Agostinho! Em contraste com seus ensinamentos percebemos que existem cristãos somente preocupados em pagar o dízimo, em exercer um gesto de caridade por aparência ou obrigação, mas que não são tocados no coração e tampouco se preocupam com a fofoca, com o criticismo, com a mentira...
O Papa Francisco declarou 2015 que a fofoca é a ferrugem da Igreja, ele assim como Agostinho, acreditava que a misericórdia está em tudo o que somos e fazemos, pois ela é a doçura de Deus, é um gesto concreto de amor, sempre a exemplo do pai misericordioso.
Santo Agostinho fala poeticamente de Cristo como misericórdia, que saiu em socorro da humanidade como um verdadeiro samaritano (sermão 365).
Crê que os cristãos são membros do corpo de Cristo misericordioso, pois se a nossa fé, esperança e caridade for nele sincera, estamos no seu corpo e somos seus membros. Santo Agostinho também fala da Misericórdia como juízo da consciência, porque Deus opera em nós de maneira que nós também devemos atuar. Para isso, ele convida a cada fiel a ser juiz de si mesmo, para depois ocupar-se do outro:” volta a ti mesmo, cuida de ti, examina-te, perscruta-te’.
Como Bispo e sacerdote Agostinho crê que os ministros da Igreja são automaticamente, ministros da misericórdia, agindo como canais da misericórdia de Deus.
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