sábado, 27 de outubro de 2018

Ver para crer ou crer para ver?


Celebramos o 30º domingo do tempo comum, onde a liturgia nos apresenta como luz e guia diante de uma realidade de incertezas. 


Na 1º leitura do profeta Jeremias 31,7-9, a comunidade de Israel está vivendo o exílio da Babilônia, onde o povo está dizimado, disperso e dividido. O profeta anima a comunidade a não perder a fé e a esperança, mas a crer em Deus e em seu plano salvador, na certeza de que o exílio chegará ao seu fim e o povo se reunirá novamente. Alguns membros haviam sido deportados a Babilônia, em sua maioria, a elite de Israel e a corte sacerdotal. Enquanto que outros sofriam o exílio na própria terra: o resto de Israel, vendo a cidade e todas as suas referências destruídas. 

O profeta Jeremias nos mostra que mesmo em tempo de crise, não podemos perder as esperanças e a nossa consciência como povo. Em tempos de crise, não podemos nos fechar ao diálogo, este é um dos piores caminhos, pois um povo dividido, é um povo fraco, é um povo fácil de manipular e roubar suas esperanças. Domingo temos uma importante decisão, infelizmente os candidatos se encontram em lados extremistas, polarizantes. A questão já ultrapassou o campo da política, que visa o bem comum, ao campo do subjetivismo narcísico, egocêntrico, que exclui completamente o outro em detrimento de si mesmo e de "seus valores". Involuntariamente me vem a pergunta: que valores são esses? Em nome de que deus falam? Certamente não são porta-vozes do Deus verdadeiro, que tem seu centro na vida e no seu direito. 

Nestes tempos sombrios suplico a vocês queridos irmãos, que acima de nossas crenças e ideologias: "que a dor não nos seja indiferente... que injustiça não nos seja indiferente... que a guerra não nos seja indiferente, pois é um monstro grande que pisa forte toda pobre inocência dessa gente... eu só peço a Deus, por mim e por vós, que a mentira não nos seja indiferente, e se um só traidor tem a mais poder que um povo, que este povo não esqueça facilmente... eu só peço a Deus que o futuro não nos seja indiferente, sem ter que fugir pra viver uma cultura diferente..." Estas sábias palavras são da cantora argentina Mercedes Sosa, inspirada em tempos de ditadura e opressão (o link da musica eu só peço a Deus: https://www.youtube.com/watch?v=6_VxXExMdMM

O centro de sua canção é a não-indiferença. Este também é o centro da mensagem de Jesus. Na passagem deste final de semana, temos um claro exemplo disso: Marcos 10 46-52, onde Jesus e o cego Bartimeu se encontram. Uma das minhas passagens favoritas e mais belas das Sagradas Escrituras. Bartimeu que vivia à margem da sociedade, reconheceu em Jesus a salvação de Deus. 

Jesus se encontrava a caminho com seus discípulos, seguidos por uma grande multidão que se somava a caminhada. Recordemos que nas beiras das estradas e nos caminhos, viviam inúmeros mendigos e pessoas com todo tipo de enfermidade, na tentativa de ganhar o próprio sustento, entre eles encontramos o simpático Bartimeu, homem de muita fé que no encontro com Jesus dá um passo de liberdade e salvação. 

Ao reconhecer a presença de Jesus ele sem medo exclama: Jesus, Filho de Davi; tem compaixão de mim! Observe que a multidão que seguia a Jesus ainda não havia aderido ao seu projeto, mas o seguia por modismo, pois diante daquele homem que clamava, se revelaram como vozes opressoras, impedindo-o de falar e de buscar a Jesus. Na vida precisamos todos os dias ser como Bartimeu, insistir uma e outra vez com mais força, até que alcancemos o nosso objetivo. Somente quando Jesus o percebe que lhe dão voz e vez, sendo capazes inclusive de animá-lo: coragem, levanta-te, Jesus te chama. Neste momento o cego dá um salto da sua condição de marginalizado e é colocado ao centro. 

Vejo neste momento uma explosão de alegria invadindo Bartimeu, que mesmo sem uma visão exterior, é capaz de vê Jesus, de um modo que aquela multidão não o havia visto. A sua fé foi o critério de salvação, que lhe permitiu recuperar a visão, assim como seu lugar na sociedade. Saiu do caminho e se pôs a caminho com Jesus e os seus, em um autêntico seguimento.

Feliz semana, muito axé e muita luz!

sábado, 20 de outubro de 2018

É necessário fazer memória para não esquecer as raízes



      A cantora argentina, Mercedes Sosa, canta em sua bela música a seguinte ação de Graças: obrigado a vida por tudo que me deu, me deu dois olhos que quando abro distinguo perfeitamente o preto do branco... me deu o som do alfabeto e com ele as palavras que eu penso e declaro... Obrigada à Vida por tudo que me deu, deu marcha aos meus pés cansados... o coração... o riso e o pranto... 

      Para aqueles que desejam ouvir a canção de Mercedes Sosa



     Desta forma poética, Mercedes Sosa eleva a Deus sua ação de graças pelas coisas elementares da vida, mas sobretudo o sentido recebido sobre ela. Pode parecer estranho, mas esta canção veio como um sopro do Espírito ao iniciar esta reflexão, pois também me sinto agradecida a Deus pelos seus cuidados e mimos. No entanto, algo da canção de Mercedes ou só me chamam bastante atenção, quando ela se refere aos olhos e o coração, pois Deus nos deu dois olhos para distinguir as coisas e também um coração, duas coisas complementares que ao mesmo tempo percebo estarem baixa em nós brasileiros atualmente. Enfraquecemos na capacidade de discernimento e sensibilidade da percepção do outro. 

  As recentes disputas políticas temos deixado cegos e irracionais e violentos. Confesso estar preocupada com o presente e o futuro do meu país, mas também com a vida dos meus amigos, familiares e da população de um modo geral, especialmente a classe mais excluída. Nosso país está sofrendo o câncer da desesperança e da perda de luz da razão. O mais admirável é ver cristãos de todas as tradições defendendo valores contrários aos do Evangelho, relativizando o nome de Deus em detrimento de interesses egoístas. Infelizmente as pessoas estão se atacando para defender partido A ou B. Quando a questão envolve religião fica ainda pior. Faço presente a frase do Pe. Manfredo Araújo de Oliveira: nenhuma religião séria pode aprovar um projeto que desconheço e que não leva a sério o eixo fundamental da dignidade do ser humano. Somos criados à imagem e semelhança de Deus. Cabe a nós cristãos, a tarefa fundamental de testemunhar em todos os níveis, especialmente da organização social, os critérios que para Jesus são fundamentais para a construção do seu Reino: a dignidade humana e seus direitos. Lembre-se, nosso voto é livre, no entanto, exige de nós o mínimo de sensatez e responsabilidade. 

    Estamos celebrando o 29º domingo do tempo comum, comemorando o dia mundial das missões, lembrando sobretudo o caráter missionário da Igreja, que nascer a partir dos gestos e palavras de Jesus e de sua entrega no lenho da cruz. Celebramos também nacional o dia da juventude, refletindo sobre sua realidade, lutas, sonhos e desafios. 

     A 1º leitura do livro do profeta Isaías 53,10-11, temos o quanto cântico do servo sofredor, que reflete a situação do próprio Israel em meio a perseguições e sofrimento, mas que sobretudo, busca ser fiel a Deus. Esta passagem foi mais tarde, relida pelas primeiras comunidades, identificando a Jesus como o servo sofredor, que carrega sobre si os pecados da humanidade. Gesto realizado por amor e consequências de uma religião e um governo corrupto, que torturou e matou a Jesus, por revelar as verdades do Reino e denunciar os abusos cometidos em nome de Deus. 

     A 2º leitura da carta aos Hebreus 4, 14-16, nos recorda que Jesus é o sumo sacerdote, que parte das realidades humanas e se caracteriza pela misericórdia. 

   No evangelho de Marcos 10, 35-45, percebemos uma dissonância entre o que Jesus ensina e o desejo de seus seguidores. Nesta narrativa temos dois momentos: o dialogo de Jesus com Tiago e João e o diálogo com os demais discípulos. Na primeira cena, Tiago e João demonstram ainda não entender a mensagem de Jesus e seus gestos. Continuam alimentando a antiga concepção de um messias glorioso, que viria com poder e majestade. Eles assim como nós, eram cabeçudos, pois Jesus falava a todo instante de renuncia, desempenhava sua missão entre os mias pobres e marginalizados. Desgraçadamente muitos cristãos permanecem cegos, atribuindo a Jesus algo que ele nunca foi e até repudiaria. Mas quantas vezes alimentamos uma fé cheia de caprichos, ambições, excluindo a uns e salvando a outros?

    O pedido dos dois revela uma briga que todos nós travamos interiormente: a briga entre o homem velho e o homem novo que nos habita. Irá sobressai aquele que mais alimentarmos. As vezes preferimos o caminho da fama, da gloria, sem querer passar pelos desafios e podas da vida, pois este caminho nos dá comodidade e segurança“. Jesus, pelo contrário, lhes propôs um caminho inverso: “quem quiser ser o primeiro seja o servidor de todos ”. Ele mesmo entrega sua vida como máxima, de amor, deixando um exemplo aos seus. Por isso, alerta para que não sejam como os chefes das nações, que oprimem e tiranizam, pois, seu legado é o do amor.

     Como cristãos, se faz necessário um constantemente regresso as fontes. para não perder nossas raízes e origens. Desejo a todos uma feliz semana, promotora do bem comum e da justiça e baseada na equidade e não na justiça cega. 

  O professor Leandro Karnal dá um banho da essência do cristianismo. Quem tiver coragem assista.


domingo, 7 de outubro de 2018

Não é bom que o homem esteja só!


Celebramos neste final de semana, o 27º domingo do tempo comum, onde a Palavra nos mostra que não é bom que o homem, a mulher, que ninguém esteja só, o que nos constitui em sociedade, com organização própria. Por isso neste domingo nos dedicamos a “festa da democracia”, escolhendo nossos representantes no campo político e econômico, o que requer maior consciência do nosso voto. 

A 1ª leitura de Génesis 2, 18-24, nos coloca no contexto do ato criacional. Nele percebemos que "Deus criou o mundo por pura generosidade, por puro prazer, sem razão, a não ser a de querer comunicar a própria vida" (Jean-Louis Ska). Isso é maravilhoso, Deus nos criou por e no amor, o que nos permite perceber que as misérias da vida não fazem parte do projeto de Deus, mas o resultado do rompimento com seu projeto inicial. 

As Sagradas Escrituras testemunham o constante amor e cuidado que Deus tem para com o ser humano: " não é bom que o homem esteja só! Vou dar-lhe uma auxiliar semelhante a ele" (v. 18). Observem que Deus cria alguém semelhante ao "homem", não um serviçal ou inferior. De acordo com este segundo o relato da criação, Deus cria a mulher a partir do homem, do mais íntimo de seu ser (v.21-23), mas tem homem achando por aí que a mulher saiu da sola dos pés, o que justificaria poder pisar, maltratar e explorar a elas. A mulher simbolicamente pode ter sido criada a partir de Adão, mas quem é portadora de vida ela, quem é capaz de gerar, amamentar, cuidar e se sacrificar por amor a um filho é ela, enquanto que muitos homens diante da responsabilidade de um filho, desaparecem sem a mínima satisfação. 

E aí podemos nos perguntar: de que serve conhecer e inventar milhares de coisas e tecnologia, se o coração do ser humano não sabe amar? Nascemos para o amor. "O ser humano foi feito para encontro, para o diálogo, para comunhão... Ele só existe quando há outro. O outro encontra-se inscrito no mais profundo de seu ser". Ao redatar estes versículos, o autor não se refere somente ao relato simbólico do primeiro casal, mas se dirige aos casais de todos os tempos, por isso afirma: o homem deixará seu pai e sua mãe, e se unirá a sua mulher e os dois serão uma só carne. 

O Salmo 128 geralmente é reservado as celebrações matrimoniais. Tanto ele como 127, buscam recordar o valor da presença de Deus nos atos humanos, pois estes serão em vão com sua ausência. 

Convido a vocês queridos casais, a lerem juntos este belo salmo, degustem e reflitam sobre as palavras nele contidas. 

A 2 ª leitura da carta aos hebreus 2, 9-11, nos recorda a ação salvifica de Jesus por meio de seu sofrimento de Cruz, que reconciliou a todos com Deus, recuperando a aliança perdida. 

O evangelho de Marcos 10, 2-16, vemos novamente Jesus sendo posto à prova pelos fariseus. O tema é o divórcio, assunto polêmico para o judaísmo daquela época e para a Igreja de todos os tempos. Quando questionado sobre o divórcio, Jesus retoma as escrituras de Israel mostrando a lei mosaica e suas exceções. Ao mesmo tempo Jesus denuncia a dureza de seus corações, motivo pelo qual Moisés teria permitido a carta de divórcio. E hoje, como está o nosso coração frente o nosso cônjuge, permanece dureza de coração? 

Cada um saberá, mas as pesquisas apontam para o aumento do número de divórcio, separação e até mesmo de violência entre casais, sendo ela verbal, física ou psicológica. Onde foi o amor que os uniu? Por que tanto desrespeito e desamor? Por que reduzimos o outro ao objeto sexual a disposição de nossos prazeres e caprichos? 

O amor é o que nos une é o que dá sentido e nos plenifica. Por isso, Jesus recorda que Deus criou o homem e a mulher, semelhantes em dignidade, diferentes em sua peculiaridade física, emocional e psicológica, diferenças que são pontos de partida para uma relação plena, de comunhão 

O casamento, a vida a dois é um continuo desafio, porém, quando bem vivido constitui uma beleza sem igual. Muitos casais se esquecem que no ato da bênção nupcial, selaram uma união entre si e também com Deus, mas com o passar do tempo, vivem seus problemas e seus dramas sem Deus, o que leva na maioria das vezes ao fim de um relacionamento. Por isso, casais, orem juntos, conversem sobre seus problemas, cultivem sonhos, planos, férias... façam valer o compromisso que selaram com Deus diante da comunidade, de se amarem, se respeitarem... 

Nos últimos versículos, Jesus acolhe as crianças como privilegiadas de seus Reino. Nesta semana, dia 12 celebramos seu dia. Peçamos a Nossa Senhora Aparecida a benção para os nossos lares, nossas famílias. Lembrando que quando um casal se separam, as crianças são as que mais sofrem. 

Feliz semana!

1º Domingo da quaresma 2020